Coordenadora da unidade explica que uma mesma vítima pode sofrer diferentes tipos de ataques, incluindo agressões físicas, e alerta sobre a necessidade de que as vítimas se conscientizem e saibam identificar os sinais de cada um deles. Mulheres vítima de violência na cidade podem busca o Cram e também são monitoradas pela Patrulha Maria da Penha, em Piracicaba
Eleni Destro/CCS
Dos 3.772 registros de violência contra mulheres atendidos pelo Centro de Referência de Atendimento à Mulher (Cram) de Piracicaba (SP) entre 2016 e este ano, 79,8% não envolveram agressão física, mas outros tipos de sofrimentos impostos à vítima, que vão de violência psicológica a patrimonial.
A coordenadora da unidade alerta sobre a necessidade de que as vítimas se conscientizem e saibam identificar os sinais de cada um deles, para que quebrem o ciclo da violência e busquem ajuda.
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De acordo com as estatísticas, 2.990 dos registros foram de violências moral, psicológica, patrimonial, sexual ou institucional. Coordenadora do Cram, Fabiana Menegon explica que uma mesma vítima pode ser alvo de diferentes tipos de violência, incluindo que envolvam agressões físicas, e ter mais de um registro contabilizado neste mapeamento.
“Nesse atendimento psicossocial ou no sociojurídico [no Cram], a gente pergunta: ‘que tipo de violência você já passou ou tem passado?’ Muitas vezes a mulher não reconhece, por exemplo, a violência psicológica. Então, a gente vai exemplificando o que seria cada tipo de violência para que ela possa, de repente, se reconhecer em alguma situação, ou identificar que alguma dessas situações tenha ocorrido com ela”, conta.
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Ela também explica que essas diferentes tipificações da violência de gênero estão inseridas ao longo das fases do chamado ciclo de violência.
“[O ciclo da violência] é permeado pela fase da tensão, onde começam as primeiras violências, a verbal e psicológica muitas vezes, e depois a fase da explosão, em que a situação toma uma proporção maior. E é normalmente nessa fase que a mulher procura ajuda, seja aqui ou acaba indo para uma delegacia, uma unidade de saúde, e logo a gente tem a terceira fase, que é ‘lua de mel’ que a gente chama, que é da reconciliação [com o agressor]”, detalha.
Quando acontece essa reconciliação, muitas mulheres deixam de comparecer ao serviço de acolhimento do Cram por diferentes motivos. “Por achar que: ‘agora voltei, acabou tudo e não preciso mais’. Ou por vergonha: ‘ah, eu fui lá numa situação, agora acabei voltando com ele’. Porque se julga. O próprio contexto da sociedade mesmo, acaba [realizando] esse julgamento da mulher”.
Quanto a isso, a coordenadora da unidade reforça que o serviço respeita todas as decisões das mulheres atendidas e as particularidades de cada caso.
“A gente não trabalha com julgamentos. Se ela está com o parceiro ou não está, o que a gente quer trabalhar é esse fortalecimento dela, que ela se reconheça numa situação de violência e ela possa ter forças e instrumentos para não permanecer num relacionamento abusivo e permeado de violências”.
Uma das abordagens do centro de referência, por exemplo, diz respeito às vítimas que não querem denunciar o autor da violência à polícia, seja por medo, vergonha ou constrangimento, e que também continuam ou voltam a viver com ele.
“Numa situação como essa, a gente costuma trabalhar com a mulher pensando em estratégias e um plano de segurança […] Então, a gente faz orientações como, por exemplo: evite uma discussão numa cozinha porque é onde tem objetos pontiagudos que podem ser utilizados como uma arma. No banheiro porque pode ter um afogamento, ele pode ter uma agressividade, bater a cabeça em um registro”.
Entre outras orientações, também é indicado sempre ter uma cópia de documentos em um lugar onde o agressor não saiba ou com uma pessoa de confiança – para que não sejam destruídos pelo autor para dificultar a busca por ajuda – e que tenha um código com um vizinho para alertá-lo caso esteja em risco.
Fabiana reforça que a unidade adequa o atendimento para cada tipo de caso, sempre com o objetivo de acolhimento da vítima. “Cada caso a gente fala que é um caso particular, não há uma receita que a gente segue para todos os casos, porque cada demanda e cada situação de cada mulher é diferente, porque cada uma tem uma história de vida e uma rede de apoio. Tudo vai depender da realidade e contexto no qual aquela mulher está inserida”
“A gente trabalha para que esse ciclo seja rompido e para o fortalecimento dela, para que ela possa se impor nessa relação ou em outras relações que ela possa ter, no sentido de reconhecer um comportamento abusivo, uma atitude que já possa caracterizar como ato violento”.
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Caroline Giantomaso/g1
Acolhimento institucional
Em casos em que a mulher está em risco iminente de morte e precisa ser afastada do lar, o Cram oferece um serviço chamado de acolhimento institucional.
“A gente faz todo o mapeamento se ela tem uma rede apoio, se ela tem familiares, amigos, que são pessoas que poderiam dar um abrigo e proteção naquele momento. Não tendo isso, a gente oferta um acolhimento institucional, que é um abrigo que acolhe mulheres e seus filhos, no caso de mulheres que têm filhos de até 18 anos”.
O local é mantido em sigilo e a ida ou não da mulher para o abrigo é uma decisão dela que é respeitada pela unidade. Segundo Fabiana, geralmente, quando a vítima não quer ir é porque tem a opção de se abrigar com familiares. Outra alternativa oferecida em alguns casos é a compra de passagem para que a mulher retorne à sua cidade de origem, quando ela assim desejar.
Quem pode buscar atendimento?
O centro de referência é porta aberta, ou seja, atende por demanda espontânea qualquer mulher vítima de violência que buscar a unidade, independente se ela procurou ou não outro tipo de serviço anteriormente. Além disso, também atende por agendamento e encaminhamento.
“Independente da mulher ter procurado delegacia, os órgãos de segurança, estar com boletim de ocorrência ou ter uma medida protetiva, isso não a impede de ser atendida por nós […] Às vezes, não chega até o serviço porque não quer registrar o boletim, não está preparada para isso. E isso [registrar boletim de ocorrência] não é requisito pra gente fazer o atendimento. Pelo contrário, a gente vai estar fornecendo todas orientações”, explica Fabiana.
A unidade também faz encaminhamentos para Defensoria Pública, rede de saúde, acompanhamento psicológico e terapêutico, para o mercado de trabalho, e serviços de habitação, socioassistenciais, educação e segurança pública. Veja como como ser atendida:
Telefone de contato: (19) 3374-7499
Onde fica: Rua Coronel João Mendes Pereira de Almeida, 230, Nova América
Quando atende: Segunda a sexta-feira, das 8h às 17h
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