‘Dark kitchens’: estudo aponta que 215 restaurantes de Limeira só atendem por entrega via aplicativo; lanche e sobremesa predominam


Segundo pesquisa da Unicamp, as dark kitchens alugam imóveis fora do Centro para ter aluguéis mais baixos, produzem em menor escala e investem em produtos diferenciados e mais baratos. Motoboys em frente a dark kitchen em São Paulo
Bárbara Muniz Vieira/g1
Quase um quarto de todos os restaurantes de Limeira (SP) que estão listados em um dos aplicativos de delivery mais populares são dark kitchens – estabelecimentos que apenas atendem para entrega via app ou pela internet que ganharam força durante a pandemia de Covid-19. É o que aponta um estudo da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
São 215 empresas nesse modelo, o que representa 22,5% de todas as 1.173 presentes no iFood. A pesquisa também apontou características desses restaurantes, como o fato de se instalarem mais distantes do Centro para pagar menos em aluguel, privilegiarem produtos diferenciados e em menor escala e predomínio da venda de lanches e sobremesas.
A pesquisa foi coordenada por Diogo Thimoteo da Cunha, professor do curso de nutrição, e tem como primeira autora Mariana Piton Hakim, ambos pesquisadores do Laboratório Multidisciplinar em Alimentos e Saúde (LabMAS) da FCA. Os resultados foram publicados em artigo na revista Food Research International.
No trabalho, foram analisados restaurantes cadastrados no iFood em Limeira, Campinas (SP) e São Paulo (SP) entre dezembro de 2020 e janeiro 2023.
“Uma das ideias era comparar duas grandes metrópoles com uma cidade que tem já um número de habitantes elevado [Limeira], ou seja, já tem um potencial grande de ter dark kitchens, mas que não é uma São Paulo e uma Campinas. Então, a ideia foi justamente comparar esses três tipos de cidades para ver a diferença entre eles”, explica Cunha.
Presença de dark kitchens em relação aos restaurantes convencionais
Ele revela que, entre essas três, Limeira foi a única da qual foram analisados todos os restaurantes cadastrados na plataforma. E observa que a diferença em relação à proporção da proporção dos estabelecimentos mapeados em Campinas [24,4% do total] é baixa. Porém, em São Paulo, o percentual é de 35,3%.
“A gente acredita que os fatores urbanos, principalmente na cidade de São Paulo, favorecem o modelo de dark kitchens por conta deles se beneficiarem de aluguéis mais baratos quando eles estão distantes dos pontos centrais. Além disso, a própria malha desses motoboys conseguirem migrar e entregar com rapidez favorece bastante isso nas cidades grandes. Então, a gente acredita que é uma resposta à própria questão urbanística da cidade de São Paulo”, aponta.
Investimento em diferenciais
O estudo também detalha os tipos de comida mais servidos pelas dark kitchens. Enquanto na capital o predomínio é da culinária brasileira, oferecida em 30,3% dos casos, nas cidades menores esse protagonismo é ocupado pelos lanches e sobremesas, servidos por 34,7% dessas empresas. Para explicar esse cenário, o coordenador do trabalho aponta uma hipótese:
“Essas dark kitchens não conseguem produzir um volume muito grande. Geralmente são espaços pequenos, adaptados e até residenciais […] Uma estratégia para eles ganharem margem de venda é vender produtos que tenham uma qualidade diferenciada. Então, eles vendem muito hambúrgueres artesanais, doces finos, cookies recheados, doces e lanches, que chamam a atenção do consumidor pelo aspecto gourmet”, analisa.
Cozinha dentro de dark kitchen na Zona Oeste da capital paulista
Divulgação
Vantagem por não precisar ‘se exibir’
Já na questão de localização, Cunha aponta que as cidades se equiparam e que a tendência é das dark kitchens estarem mais distantes do Centro.
“Isso, lógico, porque eles acabam se beneficiando de aluguéis mais baratos quando eles se afastam dos grandes Centros. […] As dark kitchens já não se beneficiam disso porque elas não precisam se mostrar ao cliente, pegar os consumidores que estão passando. Ela vai atuar exclusivamente no delivery. Se ela tiver num lugar que ela paga um aluguel menor, um lugar mais afastado do centro, mas que facilite ela a entregar essas refeições é muito melhor”, explica.
O professor acrescenta que esse e outros cortes de custos inerentes ao perfil desses estabelecimentos acabam se refletindo também no preço final dos produtos.
“Elas repassam isso, inclusive, para o cliente. Elas vendem produtos mais baratos que os restaurantes convencionais, até porque elas têm um gasto menor com funcionário, com essa estrutura, não precisa investir em beleza, em salão e isso faz com que elas possam vender mais barato”.
Análise de condições sanitárias
O grupo tem como objetivo, em um dos próximos trabalhos, visitar dark kitchens para observar de perto seu funcionamento, qualidades e defeitos e entender a percepção do produtor. Segundo os pesquisadores, entre os objetivos está entender seu impacto na economia e o que pode ser realizado para que sejam cumpridas medidas sanitárias necessárias, fortalecendo o setor e trazendo proteção ao consumidor.
O estudo está sendo realizado em parceria com a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), além de duas instituições de ensino internacionais (universidades de Central Lancashire, no Reino Unido, e Gdansk, na Polônia), o que permitirá a comparação do setor em diferentes países.
O trabalho foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Para o departamento de comunicação da instituição, o iFood afirmou que a pesquisa considerou menos de 1% da base de dados de parceiros ativos cadastrados na plataforma, que hoje é de mais de 300 mil restaurantes no Brasil.
“Reforçamos que todo nosso ecossistema, que envolve entregadores, clientes, setor público e restaurantes, tenha sempre uma relação de transparência e por isso mesmo exige, em contrato, que os seus parceiros cumpram todos os requisitos legais necessários para a operação, independentemente da escolha por estabelecimentos com salão ou apenas delivery, cumprindo a legislação fiscal, sanitária e urbanística, conforme estabelecidos pelo Poder Público, que é também responsável pela fiscalização”, acrescentou.
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